78º dia
Vendée Globe
trinca de infelizes
O brilhante, o genial, o cerebral Michel Desjoyeaux, será ,se for, sagrado bicampeão da Vendée Globe dentro de cinco dias. Se por uma ironia do destino, a vitória lhe escapar das mãos, já deixou, como ele mesmo diz, sua marca impressa na mirabolante estória da Vendée Globe.
Muito bom dia amigas e amigos velejadores!
Tenho três novidades sobre a Vendée Globe pra contar pra vocês. Leiam!
Samantha Davies do “Roxy”, a namoradinha da Vendée Globe, ultrapassou o Marc Guillemot do “Safran” esta noite, como já tinha sido previsto, resgatando assim o 4º lugar na regata, que já lhe pertencera, mas tudo indica que
a alegria da inglesinha durará pouco.
O norte-americano Rich Wilson, dobrou enfim o cabo Horn, nas imediações do qual capotou em 1990 a bordo do trimarã “Great American II”.
O brilhante Michel Desjoyeaux, que se tudo correr bem, sagrar-se-á bicampeão da Vendée Globe, dentro de cinco dias, revelou hoje, bem antes do prazo por ele mesmo estipulado, a “avaria secreta” sofrida por “Foncia” no dia de Natal, em pleno Pacífico. O eixo de sustentação do leme de bombordo do seu “tyrannosaurus rex alado” partiu e por muito pouco não foi perdido, obrigando-o a abandonar a regata. Leiam a respeito, no excelente site da regata, a matéria que possui como título “L'avarie secrète de Mich'”, para saberem de mais detalhes sobre ocorrido.
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Após as novidades que tal um pouco de filosofia? Um grande sábio costuma afirmar que “para que certas pessoas se sentissem felizes, era preciso só terem sido infelizes”. Pensando nestas palavras lembrei-me de citar os três velejadores mais infelizes desta 6ª edição da Vendée Globe, que se o tal sábio da máxima tiver razão, tem tudo pra serem os mais felizes no futuro.
TRINCA DE INFELIZES
#Yann Eliès fraturou o fêmur, a bacia e quatro costelas no dia 18/12/2008, em pleno oceano Índico, durante uma manobra na proa do seu Open 60 “Generali”, que abandonado em alta mar, após o resgate do velejador francês, foi dado como extraviado no dia 29/12/2009.
## Jean Le Cam, cujo Open 60 “VM Matériaux » capotou a 200 milhas a W do cabo Horn, quando ele se encontrava em 3º lugar, foi salvo das águas geladas do Pacífico por Vincent Riou, mas perdeu seu veleiro. Curiosamente poucos dias depois, entrevistado no PC da regata em Paris, fez o público rir com seu irresistível bom humor.
###Bernard Stamm, que teve seu “Cheminées Poujoulat” jogado sobre as pedras das ilhas Kerguelen em 13/12/2009, conseguiu a duras penas resgatar seu Open 60, que sofreu graves avarias e em conseqüência talvez jamais volte a velejar, o que ainda não foi confirmado.
Votei nestes três sinistrados como os mais infelizes da atual e 6ª edição a Vendée Globe, mas como ainda não foi inventado o “infelicitômetro” , jamais teremos certeza se não haveriam outros velejadores mais infelizes que eles, dentre os 30 que partiram cheios de sonhos de grandeza e esperança de êxito, às 13 h 02 de Sables d’Olonne no dia 9/12/2008.
De uma coisa tenho certeza, a infelicidade humana não é diretamente proporcional ao tamanho físico da perda e sim ao tamanho psicológico da perda, que é imensurável.
Outra coisa, o valor do “prêmio de seguro” de um veleiro sinistrado não cobre a perda do referido veleiro, pois que um veleiro, principalmente em se tratando de um protótipo, como é o caso desses sofisticados Open 60, que participam da Vendée Globe, vale muito mais que o seu valor nominal. Se é que concordam comigo. Concordam? Sim ou não...
Bons Ventos amigos e amigas velejadoras
e até amanhã se deus quiser
Fernando “Estrela d’Alva” Costa
MOITESSIER DOBRANDO O CABO HORN
Décima quinta “estrofe” do "poema" em versos livres MOITESSIER DOBRANDO O CABO HORN que escrevi, utilizando metade das palavras do próprio Moitessier, em seu clássico “O LONGO CAMINHO”, traduzido pela Carmen Ballot e publicado pelas Edições Marítimas.
estrofe 15
sinto que o Horn está próximo
mais próximo que nunca
mas perdi o medo e achei o sono
vou dormir
a noite continua cheia de estrelas
mil vezes mais estrelas do que as que se vê nas cidades...
meu corpo esgotado repousa sobre o beliche
mas continuo por inteiro na mastreação e nas velas
pra escutar a mar
apalpar o ar
tatear o vento que se acalma ainda mais
dizendo-me que a noite será tranqüila
tudo se espreguiça
tudo se amalgama
o eterno balanço das vagas da mar me adormece
é meia-noite
faço um último movimento lúcido
regular o despertador pra tocar dentro de uma hora
meu rumo deverá passar a 20 milhas do cabo Horn
- dorme irmãozinho dorme
- dorme que você já vez tudo o que deveria ser feito
adormeci
e comecei a sonhar
meus mais belos sonhos
meus mais terríveis pesadelos
são em plena mar que os sonho
em terra quase não sonho e quando sonho
sonho sonhos e pesadelos banais
como banal é a vida em qualquer cidade
comecei a sonhar
estou sonhando com uma pequena ilhota
que eu e meus irmão descobrimos em nossa infância no golfo de Sião
vejo sua minúscula praia de seixos rolados de um lado
e de areia fina de outro
seixos negros
areia fina e branca
não havia água na ilhota
tínhamos de levar água em nossas canoas à vela
pra não morrermos de sede na ilhota
comida não faltava
comíamos os caranguejos e mariscos da ilhota
aquela ilhota era o fim do mundo pra gente
lembro-me dela sempre ensolarada
pelos sol das grandes descobertas
plantei três cocos brotados
mais um caroço de manga na ilhota do fim do mundo
um coqueiro para cada um dos meus irmãos
e uma mangueira pra mim
agora estou sonhando com a idéia louca que me ocorreu ontem
a idéia-meteoro
querem saber do que se trata?
querem conhecer minha mais louca idéia?
querem penetrar no meu mais impossível sonho?
vou abandonar em breve esta regata
que poderia vencer, amigos
vou continuar velejando
acreditem se quiserem mas
vou dobrar novamente o Cabo Boa Esperança, o Leewin e Horn
que estou prestes a dobrar
farei o que ninguém jamais fez nem fará
abandonar um regata na liderança
manter o leme a meio
e continuar velejando em frente
keep walking
keep sailing
- porque?
- porque me sinto feliz em alta mar
e talvez para salvar minha alma
se é que um meta-orangotango vagabundo
tem alma
se tiver posso arfirmar-lhes que a minha não é das menores
pois que pra mim tudo vale a pena
“tudo vale a pena se a alma não é pequena
deus o abismo e o perigo à mar deu
mas foi nela que espelhou o céu.”
Fernando Pessoa
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