77º dia
Vendée Globe
sede de adrenalina
A grande caravana da Vendée Globe desloca-se hoje, de Paris para a “Cidade da Chegada”, em Sables d’Olonne, onde uma série de festividades, todas abertas ao grande público estão programadas, para recepcionar os vencedores da regata. Para o povo de Sables d’Olonne, vencedores são todos os que
regressam ao porto de origem, após ter realizado uma volta ao mundo em solitário, sem escalas, sem assistência e passando pelos três míticos cabos Boa Esperança, Leewin e Horn.
Muito bom dia amigas e amigos velejadores!
As últimas notícias da Vendée Globe são as seguintes:
O genial professor Michel Desjoyeaux encontra-se a menos de 2 000 milhas de Sables d’Olonne, onde uma apoteose digna de herói grego do século de ouro, lhe espera no próximo domingo, mas antes terá de encarar uma violenta frente fria, ao largo dos Açores.
Samantha Davies, a namoradinha da Vendée Globe, ameaça de perto a quarta posição de Marc Guillemot, que já lhe pertenceu no passado, ao largo de Sergipe.
Rich Wilson, o mais velho participante da regata e "súdito" entusiasta de Barack Obama deverá dobrar ainda hoje o famigerado cabo Horn.
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Não sei se vocês já notaram, mas os franceses adoram o Brasil e em especial as mulheres brasileiras. Eles são discretos, tentam disfarçar, mas a gente acaba percebendo que a França nutre uma paixão secreta pelo Brasil, apesar de volta e meia um francês ser morto ou espancado em algum lugar do nosso amado e cada vez mais violento Brasil. Vide o recente caso do casal de velejadores assaltado em Salvador. Que vergonha!
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Casal francês assaltado e agredido em Salvador tem alta
O casal francês Michele Caudre, de 64 anos, e Jean Maxime, de 62 que havia sido assaltado e agredido no sábado, no barco em que viajava, na Ilha de Itaparica (BA), recebeu hoje alta do Hospital Roberto Santos, em Salvador. O caso mais grave é de Maxime, que sofreu uma fratura na mandíbula e ainda precisa ser operado, mas pode aguardar a cirurgia descansando fora do hospital. A equipe do Consulado da França que acompanha o casal estuda a internação dele num hospital particular na capital baiana.
Os franceses, que não querem falar sobre o caso, chegaram ao Brasil em 16 de outubro, no Rio. Na sexta-feira, aportaram em Itaparica, mas, como não conseguiram vaga na marina local, resolveram ancorar no mar da Baía de Todos os Santos. Na manhã seguinte, dois homens armados, num bote, aproximaram- se do barco do casal e renderam os ocupantes. Segundo agentes da 19.ª Delegacia de Polícia (DP), que investigam o caso, foram levados R$ 20 mil, além de 2 microcomputadores portáteis, 2 relógios, 2 telefones celulares e 1 câmera fotográfica digital. Ainda não há pistas sobre os assaltantes.
Publicado em 29.12.2008, às 16h42
Fonte: Agência Estado
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Mas com certeza o povo brasileiro seria menos violento, se os europeus nos tivessem colonizado sem violência.
Seja como for tenho uma pergunta pra você, amigo leitor, que é nacionalista ferrenho.
- Quantas vezes os velejadores que participam da atual e 6ª edição da Vendée Globe já citaram o Brasil ou algum tema correlativo? Hein? Digo por escrito, nas matérias publicadas no site de regata, que verbalmente seria difícil de saber.
- Então? Diga-me. Silêncio? Engasgou?
- Engasgou! Engasgou! Engasgou!
- Normal, pra responder à minha pergunta você precisaria ter feito uma pesquisa-monstro em http://www.vendeegl obe.org/fr, pois que há 12 dias que os cascudos marujos e marujas que participam da Vendée Globe escalam lentamente, a maioria a duras penas, nossa continental costa. No momento em que escrevo estas linhas nada menos que cinco velejadores navegam ao largo da Bahia rumo ao norte. Quer uma boa notícia? Acabo de fazer essa pesquisa pra você, não contei todas as citações, são muitas, mas selecionei meia duzia que você poderá ler a seguir. Como minha tradução é sempre livre copiei o original pra você conferir.
« C'est grand le Brésil !! On m'avait appris cela en cours d'histoire-gé o à l'époque du collège mais cela ne m'avait pas vraiment marqué plus que ça. Faut dire que ce n’était pas ma matière préférée. Enfin bon aujourd'hui et depuis plusieurs jours, ça se confirme ! Surtout quand l'alizé brésilien est faible... »
“O Brasil é enorme ! Aprendi isso na escola, mas na época não me ficou uma idéia muito clara. Talvez porque Geografia não fosse minha matéria favorita. Bem, agora estou convencido de que o Brasil é realmente gigantesco, principalmente quando os alíseos sopram fracos.”
Armel le Cléac'h, vulgo « Chacal » - ( Brit Air ) - 22/1/2009
« J’ai été poursuivi hier par des pêcheurs brésiliens : j’entends crier à la VHS, je sors précipitamment et je vois un bateau de pêche à 50 mètres. Apparemment l’équipage n’était pas content, et je vois que je traîne une trentaine de flotteurs pris dans la quille et le safran. Dès que j’ai lâché les flotteurs, ils m’ont laissé, mais juste devant moi il y avait encore des flotteurs… et ça a duré sur 5 km. »
“Ontem fui perseguido por pescadores brasileiros. Ouvi gritos pelo VHF. Corri pro convés e vi um barco de pesca a 50 metros na minha esteira. A tripulação estava irada comigo, pois eu rebocava uma rede sustentada por 30 flutuadores enganchados na quilha e nos lemes do meu barco. Assim que consegui liberar a rede eles me deixaram em paz.”
Marc Guillemot, « Anjo da Guarda » - ( Safran ) - 25/1/2009
« Pour le ballon de foot, c’était quand j’étais à côté du Brésil, j’ai mis le maillot de foot avec le numéro 14 d'Akenas Véranda… »
« Vesti minha camiseta nº 14 e brinquei com a bola de futebol no convés, como se costuma fazer no Brasil.”
Arnaud Boissières, vulgo « Calí » - ( Akena Véranda ) -24/1/2009
« On ne va pas se plaindre, on est au large du Brésil et au chaud. Il y a de l'air, juste ce qu'il faut, une quinzaine de nœuds de vent."
Não tenho do que me lamentar, cá estou eu velejando ao largo do caloroso Brasil, ao sabor de um brisa amiga de uma quinzena de nós. Melhor que isso, só dois disso.”
Roland Jourdain, vulgo « Bilou » - ( Véolia Environnement ) - 16/1/2009
« O Brazil ! Le carnaval n’a lieu que dans un mois mais c’est déjà le grand feu d’artifice au large de Rio : Marc Guillemot (Safran) dansait encore la nuit dernière au milieu de plateformes de forage en zigzaguant au gré des brises entre pêcheurs et cargos, sous des grains orageux, des éclairs, du tonnerre et une chaleur… tropicale. »
Carnaval no Brasil só daqui a um mês, mas o espetáculo de fogos de artifício já começou para Marc Guillemot ao largo do Rio de Janeiro, que dançou durante a última noite, no meio de plataformas de prospecção petrolífera, orçando entre pesqueiros e cargueiros, debaixo de tempestades, relâmpagos, trovões e um calor... tropical.”
Dominic Bourgeois – redator do site da Vendée Globe - 24/1/2009
« Dans l’Atlantique Sud, les alizés de Sainte-Hélène sont toujours aussi inconstants : Marc Guillemot (Safran) a dû mal à s’éloigner des côtes brésiliennes où la brise est assez molle tandis que Samantha Davies (Roxy) est revenue très fort ces dernières heures grâce à sa route au large. »
“No Atlântico Sul, os alíseos de Santa Helena continuam inconstantes. Marc Guillemot ( Safran ) teve de se afastar da costa brasileira onde a brisa é muito fraca, enquanto que Samantha Davies ( Roxy ) avançou bastante durante as últimas horas, graças a sua rota mais ao largo.”
Dominic Bourgeois – redator do site da Vendée Globe - 26/1/2009
Bons Ventos amigos e amigas velejadoras e até amanhã se deus quiser
Fernando “Estrela d’Alva” Costa
MOITESSIER DOBRANDO O CABO HORN
Décima quarta “estrofe” do "poema" em versos livres MOITESSIER DOBRANDO O CABO HORN que escrevi, utilizando metade das palavras do próprio Moitessier, em seu clássico “O LONGO CAMINHO”, traduzido pela Carmen Ballot e publicado pelas Edições Marítimas.
estrofe 14
o vento refrescou de novo
o ar está gelado
fico à escuta
a razão me cochicha ao ouvido
- reduza os panos Bernard
- avance mais devagar Bernard
- cesse de surfar nas barbas do Horn em cima desta sua pranchinha de latão chamada “Joshua” Bernard
quero, preciso obedecer à voz da razão
mas com que forças contrariar um inconsciente tão temerário
quanto o meu?
já naufraguei duas vezes por culpa do meu inconsciente amigos
vocês todos sabem disso
todo mundo sabe disso
voltar ao pé do mastro
é imperioso voltar ao pé do mastro
voltar asinha ao pé do mastro pra arriar a vela grande
frear meu barco
aquartelar meu juízo
se é que ainda o possuo
o vento amainou
a velocidade diminuiu
tenho a impressão de acordar de um sonho
há três anos atrás, nesta mesmas paragens
a mar se acalmava logo assim que o vento diminuía
agora não sei
seria preciso ter dobrado dez vezes o Horn
pra saber o que vai acontecer desta feita
subo a farejar a noite
o vento rondou e caiu pra força 6
as ondas não são mais dentes de tubarão esfomeados que
se recortam contra o céu
mas sim belas dunas prateadas
não há mais golfinhos
nem gaivotas
nem fantasmas
reconquistei o controle da situação
mas não há meio de ficar absolutamente tranqüilo não
porque?
porque na mar tudo é relativo e muda o tempo todo
em especial nas imediações do cabo Horn
tudo está bem
de repente tudo está mal
tudo está sob controle
de repente tudo desembesta
subo pra olhar
olhar a mar produz um efeito hipnótico
que é mais forte à noite que de dia
olha-se
olha-se
olha-se infinitamente pra mar imenso
a mar voltou a crescer
amaino a mezena pra limitar a extensão das perigosas surfadas de “Joshua”
pergunto-me como pude me embriagar tanto
com a velocidade há uma hora atrás
como pude levar tão longe minha sede de adrenalina
olho pra esta mar formidável
respiro os borrifos
e sinto desabrochar aqui
no vento e no espaço
algo que necessita da imensidade do universo
para realizar-se
um meteoro!
uma idéia!
atravessou a mil por hora o céu do meu cérebro
é sempre em plena mar e nos momentos mais decisivos que me ocorrem minha melhores idéias
Victor Hugo escreveu que
uma idéia é um meteoro
amigo leitor o céu do meu cérebro acaba de ser riscado
por um meteoro
uma idéia
uma idéia meteórica
a mais louca das idéias que já me deu na telha
não consigo acreditar que pensei isso
e muito menos que farei isso
se eu fizer isso que acabei de pensar
o mundo inteiro vai me chamar de louco
num primeiro momento
mas depois
mais tarde
daqui a 10, 20, 30, 40, 100 anos talvez
ainda falarão de Bernard Moitessier
e foi dobrando o cabo Horn por volta da meia noite
do dia de hoje
que essa idéia formidável me ocorreu
estou feliz
confesso que estou feliz e cansado
acho que vou dormir
dormir pra melhor sonhar com minha
idéia meteórica
depois de conceber uma idéia como esta
não tenho mais medo de nada
nem do cabo Horn
nem do que Victor Hugo escreveu
nos TRABALHADORES DA MAR
sobre a mar e o vento
vou dormir
posso dormir amigo “Joshua”?
posso?
até mais
vou dormir
talvez morrer
que sono e morte são irmãos
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