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quinta-feira, 31 de maio de 2012

(29/12/2008) - A loura que virou gorila - Diário da Vendée Globe 2008/09 - post 50




 

50º dia
 vendée globe 
 A loura que virou gorila

 
Primeira novidade triste: o belo e sofisticado open 60 “Generali” de Yann Eliès afundou! Lamentável... Donde se conclui que um marujo sem
seu barco não é nada. E um barco sem seu timoneiro idem.



Atual pódio da regata

1° lugar – Michel Desjoyeaux
2° lugar – Roland Jourdain
3° lugar – Jean Le Cam
 

Bom dia amigas e amigos velejadores

Minha mais antiga lembrança neste mundo é a divina mar.
Porque digo a mar como os franceses e não o mar como nós brasileiros?
Porque pra mim o mar é tão feminino como nossas mães biológicas, ele que é nossa mãe-biológica- mor.
Tinha menos de quatro anos quando me lembro de ter visto a mar de Atafona pela primeira vez.
 A violenta mar de Atafona que vem engolindo a terra de Atafona... Fenômeno espantoso de se ver. Já o viram? Eu o vi em numerosos pesadelos ainda criança. Um tsunami invadindo e destruindo tudo em terra.
TUDO SE TRANSFORMA.
-         "Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma".
Lembra-se do nome do autor desta máxima, amigo leitor?
-         Chutou Lavoisier ? Por cima do travessão! Mandou mal amigo leitor. Lavoisier só apoderou-se da idéia de Mikhail Lomonosov e a divulgou em Paris.
 - Queria dizer-lhes que entre o “nada se cria” , o “nada se perde” e o “tudo se transforma” fico com este último.
-         TUDO SE TRANSFORMA.
-         Eis o grande espetáculo da vida, a transformação, a transmutação, a metamorfose.
-         TUDO SE TRANSFORMA.
-         Adoro assistir transformações e a primeira que me enfeitiçou, aos cinco anos de idade, foi a de uma bela e frágil mulher loura em enorme e violento gorila negro. Onde isso? Num pequeno circo ambulante. Inesquecível.
-         TUDO SE TRANSFORMA.
-         Recentemente outra metamorfose me encantou. A transformação da minha simples e humilde canoa a remo “Estrela d’Alva” em veleirinho de fortuna pela sábia mão do sábio e bom Nils Ostegren. Saúde mestre Nils!
-         TUDO SE TRANSFORMA.
-         Adoraria passar a noite participando de um brainstorming sobre este palpitante sujeito de estudo, a transformação, a transmutação, a metamorfose. Mas onde encontrar um grupo de debatedores interessados em metamorfose às 23 h 45? Na net? Já procurei, neca!
- TUDO SE TRANSFORMA.
-         Se os encontrasse, discutiríamos, pra começar, a transformação do meu guru Gilliatt, de simples macróbio humano em super-herói-da-mar. E quando digo super-herói, não pensem nas banais versões do super-homem hollywoodiano, mas no profundo, no transcendental, no filosófico super-homem nietzschiano. Gostaria de saber antes de mais nada se foi Victor Hugo quem leu “Assim Falava Zaratustra” ou se foi Nietzsche quem leu “Os Trabalhadores do Mar”, que vocês deveriam parar tudo que estão fazendo, pra começar a ler, right now.
-         TUDO SE TRANSFORMA.
-          O livro “ Os Trabalhadores do Mar”, amigos, conta a curiosa estória de um “pescador”/velejador de mão cheia que vive na ilha de Guernesey. Pois bem Gilliatt não faz, nunca fez mal a ninguém, ao contrário, ajuda a todos que cruzam seu caminho, e no entanto é por todos vilipendiado. Cada qual inventa uma nova calúnia a seu respeito. Cada qual arranja uma desculpa qualquer pra persegui-lo, ofendê-lo ou prejudicá-lo. Chamam Gilliatt de “filho do diabo”, só porque ele é retraído, fala pouco, mora sozinho numa casa mal assombrada e possui hábitos estranhos?


 

 
Segunda novidade triste : Sébastien Josse ( Jojô ) do « BT » jogou a toalha !

  
-         Quais hábitos estranhos? Realizar expedições em solitário, para algumas ilhotas desertas, a bordo da sua canoa alada. Andar sozinho no alto dos fiordes, à beira mar, a altas horas da noite e segundo dizem conversar com sapos. No final das contas o único “mal” que Gilliatt faz a seus semelhantes é existir e ser diferente.
-         Logo no início do romance, que na verdade é anti-romance e ao mesmo tempo um profundo tratado sobre a divina mar... logo no início do romance Gilliatt apaixona-se pela bela e jovem Der... Não, não vou contar a estória toda pra vocês não. Leiam o livro e compreendam porque a mar é a obra prima da mãe natureza, Gilliatt o rei dos velejadores e Victor Hugo um dos maiores escritores de todos os tempos e lugares. 
-         TUDO SE TRANSFORMA.
-         Falemos agora, se me permitem, do 9° tópico dentre os 10 que me fascinam na fantástica Vendée Globe.

Tópico n° 9 – A INCRÍVEL METAMORFOSE QUE A MAR OPERA NOS VELEJADORES QUE A CIRCUNAVEGAM.

Ao longo da Vendée Globe, amigos, os velejadores vão se transformando pouco a pouco em “homens marítimos” e deixando de ser “homens terrestres”. Uma espécie de retorno às origens.
Essa incrível e profunda metamorfose, em tudo positiva, que eu já havia observado lendo os livros de Aleixo Belov, Joshua Slocum, Amyr Klink, Philippe Jeantot e Bernard Moitessier, manisfesta-se através dos seguintes sinais e sintomas:
Tornam-se cada dia mais resistentes ao frio e à umidade, dos quais vão parando gradativamente de reclamar, apesar de suas roupas irem se desgastando.
Tornam-se cada vez mais resistentes às doenças e pequenos ferimentos sofridos a bordo, que tendem com o tempo a escassear.
Tornam-se cada vez mais ágeis, fortes e bem equilibrados.
Aperfeiçoam cada vez mais seus sentidos: audição, visão, olfato, tato e paladar, além de desenvolverem um “sexto sentido marítimo”, que é uma das faculdades mais preciosas que um marujo pode ter. É o que o leva a fazer a coisa certa, no momento certo, sem nem mesmo pensar.
Apuram cada vez mais seus reflexos.
Tornam-se cada dia mais inteligentes e criativos.
Tornam-se cada vez mais sábios a custa de filosofar*** sobre a existência humana, olhando pra linha do horizonte durante o dia e pras estrelas durante à noite.
Tornam-se cada vez menos preconceituosos e racistas.
Tornam-se cada dia mais humildes e sinceros.
Aprendem a valorizar os verdadeiros prazeres dessa vida: comer quando se tem fome, dormir quando se tem sono, realizar necessidades fisiológicas, tomar um bom banho de vez em quando, contemplar as belezas mil do planeta e pensar. Pensar é a grande festa!!!! Pensar é mais divertido que cantar, que dançar.
Tornam-se cada vez mais emotivos.
Tornam-se cada dia mais compassivos.
Enfim tornam-se cada vez mais capazes de sobreviver como seres vivos, cada vez mais felizes como pessoas e cada vez mais agradáveis como amigos.
Esse processo só não tem sido mais profundo, nos marujos e marujas que participam da atual Vendée Globe, por culpa dos freqüentes contatos com terra, que os modernos aparelhos de comunicação possibilitam. Não fosse isso, toda vez que um participante da Vendée Globe passasse mais de 30 dias no mar, começaria a transformar- se em Bernard Moitessier.

Querem uma prova dessa incrível transformação que tentei descrever pra vocês?

Leiam o comentário que o Jean le Cam fez durante a última “vacation radio” no site da Vendée Globe e digam-me se ele seria capaz de dizer esse tipo de coisa no primeiro dia da regata. Um discurso típico de Moitessier e não de Jean Le Cam.

“Querem saber? Nós, marujos participantes da Vendée Globe somos todos uns idiotas, em vez de irmos passear na paradisíaca Polinésia, aqui pertinho, ficamos cruzando esses portões de gelo virtuais no meio do oceano. Nada a ver.”

Jean Le Cam

Tradução livre de:

« Le passage de l'Indien au Pacifique est toujours décevant, j'imagine qu'il faut aller en Polynésie pour se faire plaisir, d'ailleurs je me demande pourquoi on n’y passe pas. Je regarde la carte et en lisant Rurutu, Rarotonga, ça a l'air sympa, par contre, Papeete c'est un peu surfait. On n’est qu'à 1500 milles, ça vaudrait le coup... Nous, on ne va voir que des portes ! un point à droite, un point à gauche et on passe au milieu, on est un peu idiots. Je ne vais jamais assez vite, ça m'énerve. »
Jean Le Cam

*** filosofia
 
A palavra filosofia é de origem grega. É composta por duas outras: philo e sophia. Philo deriva-se de philia, que significa amizade, amor fraterno, respeito entre os iguais. Sophia quer dizer sabedoria e dela vem à palavra sophos, sábio.
Filosofia significa, portanto, amizade pela sabedoria, amor e respeito pelo saber. Filósofo: o que ama a sabedoria, tem amizade pelo saber, deseja saber. Assim a filosofia indica um estado de espírito da pessoa que ama, isto é, daquela que deseja o conhecimento, o estima, o procura e o respeita.
Pitágoras de Samos teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem desejá-la ou amá-la, tornando-se filósofos. “Quem quiser ser filósofo necessitara infantilizar- se, transformar- se em menino”. (M. Garcia Morente).
http://www.brasiles cola.com/ filosofia/






Bons ventos amigas e amigos e até amanhã se Deus quiser.






Fernando “Estrela d’Alva” Costa

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