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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Vinde a mim as criancinhas! - nesletter nº 16/2008

O outro dia, amiga velejadora, o sol estava forte, mas tão forte aqui em Cabo Frio, apesar do inverno já ter começado às 20 h 59 do dia 20 de junho, que eu “abandonei” a “Estrela d’Alva”  à margem do canal de Itajurú e me refugiei debaixo de um coqueiro, que a “sociedade de consumo” esqueceu de cortar. Nisso passou por mim um grupo de pessoas. A família mínima: pai, mãe e filho. O garotinho olhou pra minha canoa alada e mandou:
 
“- Olha lá pai! É um barquinho assim que eu quero, pra sair navegando por aí.”
 
Curioso pra saber o que o pai do garotinho respondeu, amigo velejador? Pois pasme! Respondeu nada. Absolutamente nada. Olhou pra “Estrela d’Alva” com “olhar de peixe morto”, como dizia minha avó Balbina. Abriu a boca. Abriu bem a boca e bocejou com vontade. Não disse uma, nem duas palavras. A romântica fala do garotinho ficou parada no ar. Flutuando no ar à espera de comentário. E o comentário não veio. Tremenda falta de consideração, não é verdade? Deixar uma fala de criança apaixonada, sem comentário.
É por essas e outras que eu troco, no escuro, uma dúzia de adultos por uma única criancinha. As crianças são clarividentes, amigos e gostam sinceramente da minha “batera” à vela e a remo. Na verdade as crianças são as únicas pessoas que vêem a “Estrela d’Alva”. Os adultos pensam que a vêem, mas no final das contas, adultos só vêem o que a publicidade lhes mostra na TV, durante os longos intervalos comerciais, das insuportaveis e eternas novelas televisivas, que há mais de cinqüenta anos constituem o ópio do povo brasileiro. Tomem nota! 
Automóveis a motor
Moto-cicletas
Lanchas a motor
Jet skis a motor
Cortadores de grama a motor
Secadores de cabelo a motor etc. 
De preferência motor bem barulhento, pros vizinhos e transeuntes saberem que o proprietário tem “poder aquisitivo”... Eis a palavra-chave na sociedade de consumo: “poder aquisitivo”. "Poder aquisitivo" pra comprar uma geringonça qualquer movida a motor.
Portanto vinde a mim as sábias criancinhas, que percebem à primeira vista, que o inteligente barco à vela é o veículo do passado e do futuro. Veículo de felicidade e rei dos brinquedos. Ligados?
Não, não, não, por favor não bocejem, que odeio bocejos. Bocejar é coisa de quem fica em casa vendo TV, em vez de velejar ao sabor dos ventos fortes da Costa do Sol. Duvido que você boceje velejando no meio do canal dos Papagaios com o nordestão irado mandando ver pela sua alheta de bombordo. Ali, um décimo de segundo de hesitação é mastro n'água e veleiro de papo-pro-ar.
 
assinado
 
Fernando “Estrela d’Alva” Costa
 
 ou se preferirem o “maluco da canoa alada”, como alguns me chamam aqui em Cabo Frio.
 
Confesso, amigos, que no início detestava quando me chamavam de maluco. Mas depois... Depois descobri que os malucos tem mil vezes mais liberdade que os certos. E aí passei a gostar de ser malucoMaluco pode fazer o que o certo não tem nem coragem de pensar. Maluco pode escrever o que o certo não ousaria falar? Enfim, maluco que é maluco diz o que pensa e faz o que quer e ninguém se mete.
 
-         Querem um exemplo? Dou-lhes um exemplo:
 
-         Enquanto que o velejador-certo se preocupa o tempo todo em copiar e obedecer às rigorosas regras de classe, impostas pela espartana ISAF ( international sailing federation - http://www.sailing.org/ ), o velejador-maluco amarra uma vara telescópica de pescar na ponta do gurupés, da sua canoa à vela e parte todo feliz rumo às belas e selvagens ilhas da Costa do Sol. Ha ha ha ha! Podem rir, riam à vontade, que eu fui o primeiro a rir de mim mesmo. Uma vara de pescar telescópica, arvorando três bandeirolas triangulares, amarrada na ponta do gurupés de uma canoa à vela, é mesmo muito engraçado. Ha ha ha!
 
-         Moral da estória, à primeira vista, o amor. No vinho, a verdade. Na loucura, a liberdade. E vocês? Esperando o que pra se livrarem do pesado fardo da previsível certeza e das espartanas regras da ISAF? Hein? Não, não, por favor, amigo velejador, não leve os argumentos deste prólogo muito a sério, que os "escrevi com a pena da galhofa e a tinta da melancolia", como disse mestre Machado.

Extrato da newsletter n° 16 de 11/8/2008 - Projeto Estrela d'Alva

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