Se você anda se perguntando, amiga leitora, porque cito tanto a França neste nosso blog dedicado à divina MAR, à inteligente VELA e ao sagrado MEIO-AMBIENTE, leia este post, que importei especialmente pra vocês da revista-papel "Label France" e saiba porque.
Fernando Costa
A França, por ser um imenso istmo entre a Europa do Norte e a Europa do Sul e possuir o maior espaço náutico europeu, com mais de 5.500 quilômetros de costa, está naturalmente voltada para o mundo marítimo.
Se o elo orgânico entre o meio marítimo e a França manifestou-se, nos séculos passados, por uma frota numerosa de poderosos navios, com entrepostos de comércio marítimos em todos os continentes e vários navegadores, como Bougainville ou Dumont d’Urville, descobridores da Antártida, partindo para explorar nosso planeta, essa relação entre o mar e o povo francês apresenta hoje múltiplas faces, menos espetaculares mas sempre indicativas do amor dos franceses pela MAR.
Ao longo dos séculos XIX e XX, graças aos progressos tecnológicos e às melhores condições sociais, milhões de franceses passaram a ter acesso ao mundo da MAR. As ferrovias facilitaram o deslocamento para as regiões costeiras e, início do século XX, surgiram os primeiros banhos de MAR e os balneários – Le Touquet, Biarritz, Nice, etc. Mas, embora o Iate Clube da França tenha sido criado em 1867, os esportes aquáticos ainda são privilégio dos mais abastados.
Foi a instituição das férias remuneradas, em 1936, que permitiu a um número maior de famílias desfrutar dos prazeres do mar. Mas a verdadeira corrida rumo ao ouro azul ocorreu entre os anos 1950 e 1970. A melhora do nível de vida das famílias, a democratização do automóvel e a evolução dos costumes – as mulheres passaram a usar maiô, o que não ocorria no século XIX – democratizaram os lazeres náuticos. O litoral viveu uma explosão imobiliária: hotéis, residências de férias, casas de praia e restaurantes se multiplicaram. Hoje, o mar é o destino preferido de dois terços dos franceses, que, às vezes, vão buscá-lo no exterior.
O sucesso dos esportes náuticos
Contudo, o sinal mais significativo dos últimos anos é o interesse crescente de nossos compatriotas pelos esportes náuticos. Sobretudo pela vela. Ao lado de Glénans – a mais famosa escola de vela da França – surgiram centenas de clubes de vela em todos os cantos do litoral e as colônias de férias para crianças e adultos. Em 2006, estima-se em 4,5 milhões o número de barcos de passeio na França (veleiros e barcos a motor) e, apesar da criação e da ampliação das marinas, o tempo de espera por um atracadouro (vaga na marina) pode chegar a cinco anos, como em La Baule ou Saint-Malo (costa atlântica).
As vitórias conquistadas pelos atletas franceses – Bernard Moitessier, Éric Tabarly, Florence Arthaud, os irmãos Perron, Isabelle Autissier, e tantos outros – fomentam também essa paixão popular. “As vitórias de Éric Tabarly na Transat em 1964 e de Florence Arthaud na Rota do Rum em 1990 tiveram um impacto extraordinário”, assinala Sylvie David-Rivérieulx, especialista apaixonada pela história da navegação na França e relações públicas do Museu Nacional da Marinha. “O fato de um pedacinho de mulher, que não tinha nem trinta anos, ter vencido essa corrida em um catamarã, muito à frente dos homens, marcou profundamente as pessoas”.
Além da vela, os franceses atualmente dedicam-se cada vez mais a todo um conjunto de esportes náuticos: Biarritz sedia todo ano um campeonato de surf; Marselha é um centro internacionalmente conhecido pela formação de mergulhadores submarinos; a prancha a vela, o remo e o caiaque de mar também possuem milhares de praticantes, e alguns campeões mundiais. Os aposentados, que migram para o litoral a cada dia, adquirem mais e mais barcos a motor, para a pesca do barbo. Os executivos estressados apaixonaram-se nos últimos anos pela talassoterapia (ver Label France n° 54), meio rápido, embora caro, de recuperar a saúde.
“A MAR faz sonhar...”
A atração pelo mar também pode ser cultural. As grandes reuniões de veleiros e velhos navios ocorridas há quinze anos, como em Douarnenez, Rouen, Brest ou Cannes, atraem multidões. Os aquários gigantes, como os de Croisic, Biarritz, ou, ainda mais, de Boulogne-sur-Mer, com seu Centro Nausicaä, que recebeu mais de 9 milhões de visitantes, oferecem emoção com o risco de, por exemplo, se encontrar um tubarão... por trás de um vidro!
Mas, nesta época em que a televisão serve de termômetro para a análise dos centros de interesse das pessoas, um dos sinais mais visíveis do gosto dos franceses pela MAR é o espaço que este ocupa na mídia. Basta lembrar a audiências dos programas de Cousteau ou da novela Os Segredos da MAR, feita a partir dos relatos de
Henry de Monfreid. “Há vinte anos, não havia sequer uma câmera a bordo nas grandes corridas. Hoje, o noticiário da noite mostra a Rota do Rum ou Vendée Globe”, comenta Didier Ravon, redator-chefe de Voiles et Voiliers (Velas e veleiros). “A televisão teve um papel enorme para o desenvolvimento do interesse pela MAR na França. Um programa como Thalassa teve um papel chave”, comenta Sylvie David-Rivérieulx. É verdade que esse programa, o mais popular do país, atinge mais de 4 milhões de telespectadores por semana. Se perguntarmos a Georges Pernoud, seu criador e apresentador, como ele explica o sucesso de Thalassa, ele responde apenas: “A MAR faz sonhar...”. E ainda esclarece, indiretamente, o desejo que ele provoca na França e em outros lugares: “O mundo do mar é um mundo onde os homens são apaixonados [...] o homem não tem brânquias; assim, o perigo sempre está por perto”. Sem dúvida, são essa paixão e esse risco, normalmente ausentes na vida cotidiana de nossas sociedade modernas, que fascinam e atraem tanto na MAR...
A mar, uma lição de vida
O que o mar ensina ao homem de hoje? Fizemos a pergunta a Jean-Noël Gard. Aos sessenta anos – quarenta dos quais navegando – esse vice-almirante é hoje o diretor do Museu Nacional da Marinha.
“O mar ensina a modéstia: ele é sempre o mais forte. Se ele não quer
dar passagem, não dá.
Ele ensina a resistência: de barco deslocamo-nos durante muito tempo, nunca muito rápido; o mar dá uma outra percepção do tempo.
Ele abre para o mundo: encontramos muitos povos que vivem de
maneiras muito diferentes.
Ele ensina o convívio com os outros: uma tripulação é, antes de tudo, uma equipe”.
“O mar ensina a modéstia: ele é sempre o mais forte. Se ele não quer
dar passagem, não dá.
Ele ensina a resistência: de barco deslocamo-nos durante muito tempo, nunca muito rápido; o mar dá uma outra percepção do tempo.
Ele abre para o mundo: encontramos muitos povos que vivem de
maneiras muito diferentes.
Ele ensina o convívio com os outros: uma tripulação é, antes de tudo, uma equipe”.
Livros sobre a MAR: os navegadores gostam de escrever
Os marinheiros devem escrever: manter um livro de bordo é obrigatório, mas, sobretudo, eles gostam disso. E, na França, a paixão pelo mar traduz-se e é alimentada pela produção de relatos de viagem. Os dos grandes navegadores são best-sellers, como as obras de Bernard Moitessier, Éric Tabarly, ou Florence Arthaud. Os dos escritores também. Jean-François Deniau, membro da Academia Francesa [de Letras], ex-Ministro da Marinha e marinheiro, autor do recente Dictionnaire amoureux de la mer (Dicionário amoroso do mar), publicou vários livros de sucesso, particularmente La mer est ronde (O mar é redondo). Erik Orsenna, também membro da Academia e vencedor do Prêmio Goncourt de 1988, que recebeu o título de “Escritor de Marinha”, vendeu mais de 200.000 exemplares de seu Portrait du Gulf Stream (Retrato do Gulf Stream),
publicado em 2005.
Vários editores criaram coleções dedicadas aos relatos de viagens marítimas, como Payot e sua coleção “Voyageurs” (Viajantes). A editora bretã Ouest-France publica muitas obras dedicadas à vida de pessoas de antigamente que conviveram com a MAR. Vários festivais e prêmios coroam livros de literatura marítima. O Prêmio Corderie Royale-Hermione é um dos mais recentes.
Nadia Khouri-Dagher jornalista
Para saber mais:
• Site do governo francês: http://www.mer.gouv.fr/
• Escola de Glénans : http://www.glenans.asso.fr/
• Livraria marítima on line: http://www.librairie-maritime.com/
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