Às vezes quando um curioso que ainda não me conhece, me pergunta:
- Vai pescar?
- Vai pescar?
Eu respondo irônico:
- Só baleia e tubarão dos grandes!
Não satisfeito com minha resposta o curioso conclui:
- Já sei, vai passear...
E eu com meus botôes:
- Passear? Passear?!! Passear ao longo de sete dias consecutivos a bordo de uma simples canoa a remo e à vela? Passear é pouco. Passear seria velejar até a ilha dos Papagaios e voltar para Porto Veleiro duas horas mais tarde. Vou é realizar um "seshin" marítimo em solitário. Isso sim. Para quem não sabe, "seshin" é uma palavra japonesa que designa o retiro espiritual que os adeptos do zen-budismo realizam, por exemplo, no mosteiro do morro da Vargem.
Sentados em posição de lotus inteira, os praticantes do "zazen" passam períodos de 40 minutos olhando fixamente para a parede branca do templo em busca da harmonia com o eu interior e sonhando com o transcendental “satori”. O que não me agrada nessa estória é a meditação em sala fechada e em grupo. E à paz das montanhas prefiro o relativo e misterioso silêncio do mar, a bordo de um barco à vela primitivo/sofisticado como é o caso da "Estrela d'Alva".
Minha mais nova teoria, amigos, é que velejar em solitário, sob certas condições, é uma arte zen que os japoneses esqueceram de catalogar ao lado da cerimônia do chá ( chanoyu ), da caligrafia ( shodô ), da pintura ( sumi-e ) , da poesia ( haikai ), dos arranjos florais ( ikebana ).
Prestem atenção na jornada de um velejador solitário. Acordar com o sol. Observar atentamente a superfície do mar e as nuvens do céu em busca de um significado. Avaliar a intensidade do vento para poder escolher a área vélica adequada. Marear as velas a todo instante para conseguir o melhor equilibrio do barco e atingir a velocidade ideal. Traçar os rumos mais adequados, para melhor avançar orçando, em direção ao ponto que se pretende atingir. Tudo isso envolto pelo segredo das águas desertas.
Tudo isso diante da imutável linha hipnotizante do horizonte. Tudo isso em silêncio. Tudo isso com a mente concentrada, o que não o impede de filosofar profundamente sôbre o sentido da vida. Querem saber? Eu diria que velejar em solitário é a mais zen das artes. E que todo velejador solitário é um filósofo contemplativo e um artista sui-generis, cuja suprema arte é velejar com elegância. E voces o que me dizem? Hein?
Um grande abraço amigas e amigos e até breve!
Fernando Costa
Newsletter n° 2 de 24 de janeiro de 2008 - projeto "Estrela d'Alva"
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