Minha revista virtual predileta “l’Internaute” noticiou com entusiamo a recente conquista do François Joyon nos seguintes termos:
“Domingo, dia 20/1/2008, após 57 dias, 13 horas, 34 minutos e 6 segundos de mar François Joyon bateu o recorde de volta ao mundo à vela em solitário. A bordo do seu trimaram “IDEC”, o marinheiro francês esmagou o antigo recorde que pertencia até então à inglesa Ellen McArthur, com uma vantagem de 14 dias.”
http://www.linternaute.com/
Para quem quiser ler os artigos de “l’Internaute” sem saber francês, recomendo a tradução on line da Babel Fish. Fácil e eficiente, sem chegar a ser perfeito, como tudo que é feito por um robô ou por um ser humano.
Vou confessar-lhes uma nova fantasia que me ocorreu ao ler essa notícia. Adoraria ter coabitado o cérebro ou o trimaram-bólido-gigante do François Joyon, durante as vinte quatro horas em que ele velejou mais rápido, ao longo da sua incrivel volta ao mundo, realizada a 19,09 nós de média. Inimaginável. Nem Julio Verne que dá nome ao prêmio que o François Joyon recebeu pode conceber semelhante conquista. Ele que foi o escritor, cuja ficção mais se aproximou da realidade até o momento. Disse que adoraria ter coabitado o cérebro ou o veleiro do François Joyon durante suas 24 horas mais rápidas e não mais que essas alucinantes 24 horas. A velocidade a bordo de um barco à vela é a velocidade que mais me fascina dentre as outras velocidades que já experimentei ( automóvel, moto e avião ), mas confesso que não gosto da velocidade full time. Gosto da velocidade eventualmente, como gosto do suco de açaí, num copo de 200 ml, duas ou tres vezes por semana e basta.
- Só? Perguntaria espantado um viciado em velocidade ou em suco de açaí.
- Só! Pra que mais? Tudo que é bom demais deve ser saboreado com moderação pra não matar o desejo.
Depois de uma ou duas boas doses de velocidade a bordo de um barco à vela, gosto de uma velejada mais light... A uns quinze nós de vento digamos... Não consigo entender como os lancheiros adoram fazer sempre a mesma coisa... Apertar um botão e sair navegando “a mil por hora”. Deve ser tão monótona essa certeza de chegar onde se quer, na hora que se quer e sempre a toda velocidade. Prefiro viver ao deus dará dos caprichos de Éolo... Hoje rápido. Amanhã devagar. Depois de amanhã devagar quase parando e enventualmente cair nas garras de uma boa calmaria. Já reduzi a área vélica da minha canoa alada, pra chegar mais devagar ao meu destino, só pelo prazer de saborear mais tempo a paisagem e os meus pensamentos. Sim porque quanto mais devagar avança nosso barco à vela, mais profundamente a gente pensa. Isso quando velejamos em solitário, que é a meu ver a forma ideal de velejar.
Outro dia vinha eu voltando de Arraial do Cabo, quando o vento minguou até reduzir-se a zero. E aí eu fiquei boiando durante mais de duas horas num mar cinza, encoberto por nuvens cinzas. Com um curioso sol-clarabóia pendurado no zenith. Um verdadeiro limbo existencial. De repente apareceu uma baleia Jubarte entre a ilha dos Papagaios e a do Pontal e a bordo da minha canoa uma mosca. Graças àquela providencial calmaria filosofei longamente sôbre a condição humana, olhando hora a baleia, hora a mosca, hora as nuvens cinzas, hora meu adorado arquipélago dos Papagaios. Pensei tanta coisa importante, graças àquela providencial calmaria... Meus pensamentos só eram temporariamente interrompidos quando uma lancha cruzava meu campo visual a toda veloc. Quando o vento reapareceu foi de má vontade que voltei pra Cabo Frio. Amigos, uma calmaria longe da costa é muito mais propícia à meditação que o mais silencioso templo budista. E a leitura de um livro num barco à vela, em solitário, é a forma mais eficaz de se entrar em contato íntimo com o autor, já dizia mestre Moitessier.
Fernando Costa
Newsletter n° 04 de 20 de fevereiro de 2008 - projeto Estrela d'Alva
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